Diminuir a mortalidade por doença cardiovascular: qual a melhor estratégia no Brasil?

Este assunto foi tema de debate entre especialista no último congresso da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, realizado recentemente. O Dr. Álvaro Avezum, cientista brasileiro reconhecido como um dos pesquisadores com produção acadêmica de impacto no mundo, considera que em mortalidade, no Brasil e no mundo, o infarto agudo do miocárdio é o evento de maior relevância, ressaltando que, embora já haja formas efetivas de reduzir o risco, esta faltando efetividade nas orientações aos pacientes. Disse ele ” com o conhecimento que dispomos, se fôssemos bons em influenciar as pessoas, evitaríamos 90% dos eventos de IAM”
O Dr. Avezum referiu o estudo chamado INTERHEART, realizado em 52 países, envolvendo 15.152 pacientes que sofreram IAM e outros 14.820 indivíduos no grupo controle, o qual  reforçou a relevância dos fatores de risco para a ocorrência do infarto agudo, como a dislipidemia, o tabagismo, a hipertensão, o diabetes, a obesidade abdominal e os problemas psicossociais, como a depressão, que prejudicam a saúde cardiovascular. Este estudo evidenciou que não importa se mais jovem ou mais velho, se homem ou mulher, em todo o planeta os fatores condicionantes são os mesmos, disse ele.
Fato é que, ao redor do mundo, o controle desses fatores seria capaz de reduzir em 90% a probabilidade do IAM nos homens e em até 94% nas mulheres.
Aliás, oito em cada dez mortes por IAM ocorrem em países de baixa ou média renda, de acordo com o estudo PURE[2], citado pelo Dr. Avezum e do qual ele também é um dos autores. Em países mais desenvolvidos como o Canadá, Emirados Árabes e Suécia a incidência dos fatores de risco listados no INTERHEART é estimada ser 30% mais elevada do que o Brasil, que está no grupo das nações renda média, no entanto, no Brasil há o triplo de mortes. Talvez a causa seja uma prevenção secundária ineficiente.
O Dr. Avezum exemplificou com um dos desdobramentos do estudo PURE América Latina, intitulado Utilização de Medicações Comprovadamente Eficazes em Prevenção Secundária na América do Sul, que está para ser publicado no Global Heart “o dado mundial, que inclui o Brasil, é de que o controle da hipertensão arterial está em 15%, na melhor das hipóteses”, disse.
Segundo o Dr. Avezum, o país precisa dar prioridade na prevenção secundária, aquele fator de risco que, se combatido com afinco nesse período, trará melhores resultados. Na prevenção primária, o Brasil também precisará se esforçar para reduzir o tabagismo que esta na faixa de 16%.
Porém, os obstáculos continuam. Quando o médico do posto de saúde ou até mesmo do consultório particular prescreve o tratamento correto, logo aparece outro problema: a falta de adesão. E não só no caso do tabagismo. O mesmo acontece com a hipertensão, de acordo com os profissionais que discutiram o tema no simpósio. “No que diz respeito ao controle dos níveis pressóricos um pequeno aumento no controle agora já resultará uma redução significativa da mortalidade até 2025. Infelizmente na a prática o que parece mínimo é bem complicado para alcançar”, concluiu Dr. Avezum.
Para o Dr. Antonio Carlos Palandri Chagas, engajar a comunidade em campanhas de prevenção é fundamental. Ele demonstrou preocupação com o futuro relembrando aos presentes o estudo ERICA, publicado no ano passado, que avaliou o risco cardiovascular nos adolescentes brasileiros, acompanhando 73.339 estudantes de 32 escolas de regiões diferentes do país. No Norte e no Nordeste, 8,4% das crianças eram obesas. No Sul, a prevalência de obesidade entre os jovens ficou em 12,5%. E a prevalência de hipertensão nos estudantes brasileiros obesos foi de 17,8%. No total, considerando os jovens com sobrepeso, 28,4% dos participantes tinham níveis pressóricos elevados. “Não podemos pensar em estratégias para estancar a mortalidade por doença cardiovascular sem olhar para nossos filhos e netos, desenvolvendo projetos voltados às crianças”.
O Dr. John A. Spertus defendeu a necessidade de os profissionais da Medicina registrarem os eventos cardiovasculares e as condutas tomadas rigorosamente, como ocorre em instituições de saúde americanas]. O National Cardiovascular Data Registry (NCDR), já acumula dados de mais de 60 milhões de pacientes.
“Esse é, ao meu ver, o caminho objetivo e factível para melhorar a qualidade do atendimento em saúde, porque podemos saber quais práticas trazem maiores benefícios conforme o perfil de cada caso”, afirmou.”Como médicos, presumimos que estamos oferecendo a melhor alternativa, mas pode não ser assim. E, nos Estados Unidos, essa visão mudou quando as companhias de seguro alteraram as regras do jogo.
Antes, se o paciente chegava com angina e passava por uma angioplastia, o hospital recebia por isso. Se, por acaso, ocorria uma complicação e ele precisava ficar mais tempo internado, o hospital também recebia por isso. Assim como continuava a receber se o indivíduo mostrava sinais clínicos de que precisava de uma diálise ou qualquer outro tratamento para controlar quaisquer complicações. Agora é diferente, diz ele. “O seguro informa que disponibiliza 25 mil dólares, por exemplo, para tratar um evento cardiovascular do instante em que o paciente atravessa a porta do hospital até os 90 dias seguintes. Ou seja, qualquer complicação pesa no bolso da instituição. Essa nova forma de pagamento gerou a necessidade de métricas capazes de dar maior segurança na hora de decidir por uma conduta ou outra. No final, está sendo mais efetivo desta forma.”
Não é por acaso que nos Estados Unidos, as instituições de saúde, o número de médicos contratados aumentou menos de 50% entre 1970 e 2009, enquanto o número de administradores saltou mais de 300%.”
Fonte:

XXXVIII Congresso da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo)

http://portugues.medscape.com/verartigo/6501336
Diminuir a mortalidade por doença cardiovascular: qual a melhor estratégia no Brasil e no mundo? – Medscape – 3 de julho de 2017.